Encontro no Alasca foi um momento marcante para Putin.
Reuters
O encontro realizado nesta sexta-feira (15/8) no Alasca entre o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o líder russo, Vladimir Putin, foi anunciado como um passo fundamental rumo à paz na guerra na Ucrânia.
Mas, sem anúncio de acordo de cessar-fogo ou um consenso em relação a todos os itens que estavam na pauta, a reunião de quase três horas terminou com mais perguntas do que respostas.
Na manhã deste sábado (16/8), Trump participou de ligações com aliados dos EUA da Europa e o ucraniano Volodymyr Zelensky, que confirmou um encontro com o presidente americano em Washington na segunda-feira.
Após os telefonemas, o republicano afirmou nas redes sociais que a melhor maneira de acabar com a guerra entre Rússia e Ucrânia “é ir diretamente para um acordo de paz” em vez de um cessar-fogo temporário “que muitas vezes não se mantém”.
Entenda, a seguir, qual foi o saldo da cúpula para Trump, Putin e Zelensky em 6 pontos.
Putin recebido como ‘parceiro e amigo’
Quando Vladimir Putin desembarcou no Alasca na sexta-feira, o céu estava nublado. Esperando com um tapete vermelho estendido sobre a pista da Base Conjunta Elmendorf-Richardson estava o presidente dos EUA, Donald Trump.
Quando Putin se aproximou, Trump aplaudiu. Os dois líderes apertaram as mãos calorosamente e sorriram.
Vídeo: Trump e Putin se cumprimentam no Alasca
Foi um momento marcante para Putin – um líder que a maioria das nações ocidentais tem evitado desde que Moscou lançou sua invasão em larga escala à Ucrânia em 2022.
Desde então, o presidente russo tem limitado suas viagens internacionais a países amigos da Federação Russa, como Coreia do Norte e Bielorrússia.
Putin é alvo de pedido de prisão do Tribunal Penal Internacional (TPI) por supostos crimes de guerra durante o conflito na Ucrânia — algo que o Kremlin nega — e pode ser preso em países signatários do Estatuto de Roma, que criou o tribunal em 2002.
O simples fato da cúpula do Alasca ter acontecido já foi uma vitória para Putin. Mas a recepção dada ao líder russo teria superado até os sonhos mais loucos do Kremlin.
Em apenas seis meses, Putin deixou de ser um pária aos olhos do Ocidente para ser recebido em solo americano como um parceiro e amigo.
Para completar, em um momento aparentemente improvisado, Putin decidiu aceitar uma carona até a base aérea na limusine blindada de Trump, em vez de dirigir seu próprio carro presidencial com placa de Moscou.
Quando o veículo se afastou, as câmeras focalizaram Putin, sentado no banco de trás, rindo.
O que cúpula do Alasca significa para Trump, Putin e Zelensky em 6 pontos.
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O encontro no Alasca foi anunciado em 8 de agosto, na data em que se esgotou o prazo estabelecido por Donald Trump para que o líder russo aceitasse um cessar-fogo imediato ou enfrentasse sanções mais duras dos EUA.
E apesar da reunião ter terminado sem uma conclusão, oficialmente não foram mencionadas novas sanções ou prazos para uma resolução.
Trump foi questionado sobre o tema em uma entrevista à Fox News antes de retornar a Washington e afirmou que poderia considerar novas medidas “talvez em duas ou três semanas”.
Mas, considerando que o presidente prometeu “consequências severas” se a Rússia não avançasse em direção a um cessar-fogo, uma resposta tão imprecisa pode suscitar mais perguntas do que respostas, avalia o correspondente para América do Norte da BBC, Anthony Zucker, que acompanhou o encontro em Anchorage.
Putin enfrentou questionamentos diretamente
Em seus 25 anos como presidente, Putin conquistou controle total sobre a mídia, esmagando as liberdades jornalísticas e substituindo informação por propaganda. Na Rússia, ele raramente – ou nunca – se depara com repórteres hostis.
No entanto, poucos minutos após o desembarque no Alasca, um jornalista gritou em sua direção: “Você vai parar de matar civis?”. Se a pergunta o incomodou, ele não demonstrou, parecendo dar de ombros e desviar o olhar.
Durante uma breve e um tanto caótica sessão de fotos, mais perguntas foram feitas, incluindo uma em russo sobre se Putin estaria pronto para se encontrar com o presidente Volodymyr Zelensky para uma cúpula trilateral. Novamente, não houve nenhuma reação óbvia do presidente russo além de um sorriso enigmático.
‘Vitória clara’ de Putin
Apesar de ter enfrentado questionamentos da imprensa de uma maneira com a qual não está acostumada, analistas também enxergaram a participação do presidente russo na cúpula como uma “vitória clara”.
A imprensa mundial reunida no Alasca esperava que uma coletiva de imprensa fosse realizada após a reunião, mas Putin e Trump apenas deram declarações e não responderam a perguntas dos repórteres.
Excepcionalmente, Putin foi o primeiro a falar. Ele elogiou a “atmosfera construtiva de respeito mútuo” das negociações de “vizinhança” e, em seguida, se dedicou a falar sobre o passado do Alasca como território russo.
Enquanto Putin falava, Trump permaneceu em silêncio. Para Anthony Zucker, correspondente para América do Norte da BBC, a cena foi totalmente diferente do que costuma acontecer em encontros com outros líderes na Casa Branca, quando o presidente dos EUA costuma ser cortejado enquanto seu homólogo estrangeiro observa sem fazer comentários.
“Embora o Alasca seja território americano, Putin parecia mais à vontade”, diz Zucker.
Passaram-se vários minutos de discurso até que o presidente russo mencionasse o que chamou de “situação na Ucrânia”. Quando o fez, foi para afirmar que, embora um “acordo” não especificado tivesse sido alcançado, as “causas profundas” do conflito precisavam ser eliminadas antes que a paz pudesse ser alcançada.
A frase deve ter disparado o alarme em Kiev e além. Desde o início da guerra, tornou-se uma espécie de código para uma série de demandas intratáveis e maximalistas que, segundo Putin, impedem um cessar-fogo.
Entre as demandas está o reconhecimento da soberania russa sobre as regiões ucranianas da Crimeia, Donetsk, Luhansk, Zaporizhzhya e Kherson, bem como a concordância da Ucrânia com a desmilitarização, a neutralidade, a não participação militar estrangeira e a realização de novas eleições.
Essencialmente, equivalem a uma rendição – inaceitável para Kiev – mesmo após três anos e meio de conflito sangrento –, mas primordial para Moscou.
Com isso, ficou claro que não houve acordo.
O que cúpula do Alasca significa para Trump, Putin e Zelensky em 6 pontos.
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O presidente também usou sua declaração ao lado de Trump para alertar os países da Europa a não interferirem em seus laços com os Estados Unidos.
Segundo Tom Bateman, repórter da BBC News no Alasca, foi mais uma tentativa de Putin de ampliar as divisões entre a Casa Branca e seus tradicionais aliados europeus — algo que ele vem fazendo repetidamente sob o governo Trump.
“Como arquiteto da guerra, Putin recebeu um abraço americano eficaz, uma recepção com tapete vermelho e aplausos presidenciais. Trump, em troca, não recebeu nada para apresentar como uma conquista tangível. A cúpula, portanto, representa uma vitória clara para Putin”, avalia Bateman.
Contido, Trump não entra em detalhes
Extraordinariamente – dado o contexto e a premissa da cúpula – quando chegou a vez de Trump falar, ele não mencionou a Ucrânia nem a possibilidade de um cessar-fogo.
O mais próximo que o presidente americano chegou de se referir ao conflito foi dizer que “cinco, seis, sete mil pessoas por semana” são mortas e observar que Putin também queria ver o fim do derramamento de sangue.
O geralmente loquaz Trump parecia ter menos a dizer do que Putin. Sua declaração foi notável por sua relativa e incomum brevidade – mas principalmente por sua imprecisão. “Houve muitos, muitos pontos em que concordamos”, disse Trump, acrescentando que “grande progresso” havia sido feito em uma “reunião extremamente produtiva”.
Mas ele não compartilhou nenhum detalhe e não parece ter tomado nenhuma medida concreta para uma resolução do conflito ucraniano.
E – para alívio de Moscou – não houve menção a quaisquer “consequências graves” que Trump ameaçou que ocorreriam se um cessar-fogo não fosse alcançado.
“Não chegamos lá”, admitiu Trump.
Então, com otimismo, embora vago, acrescentou: “Mas temos uma chance muito boa de chegar lá.”
Já neste sábado, após conversas com líderes europeus e representantes ucranianos, Donald Trump afirmou que “foi decidido por todos que a melhor maneira de encerrar a terrível guerra entre a Rússia e a Ucrânia é chegar diretamente a um Acordo de Paz”.
Em uma postagem em sua plataforma Truth Social, Trump afirma que isso encerraria a guerra e seria mais substancial do que “um mero Acordo de Cessar-Fogo”.
O presidente dos EUA também acrescentou que teve “um dia ótimo e muito bem-sucedido no Alasca”.
Um encontro em Moscou?
A cúpula pode não ter produzido nenhum progresso tangível rumo à paz na Ucrânia, mas consolidou a reaproximação entre a Rússia e os EUA.
Imagens dos dois presidentes apertando as mãos repetidamente e sorrindo circularam amplamente nas redes sociais – assim como imagens de militares americanos ajoelhados enquanto estendiam o tapete vermelho aos pés do avião de Putin.
Antes de concluir sua declaração, Putin fez referência a um dos pontos frequentes do presidente americano: que o conflito na Ucrânia nunca teria começado se Trump estivesse no poder.
Apesar da afirmação de Trump de “grande progresso”, nada de substancial foi revelado na cúpula do Alasca – ainda assim, os dois líderes deixaram a porta aberta para outro encontro, desta vez em solo russo. “Provavelmente os verei novamente em breve”, disse Trump.
Concluindo uma declaração conjunta na qual não teve que fazer promessas ou concessões, Putin pode ter se sentido à vontade o suficiente para falar em inglês – uma ocorrência rara. Rindo, ele olhou para Trump e disse: “Da próxima vez em Moscou.”
“Ah, essa é interessante”, disse Trump. “Vou ser um pouco criticado por isso, mas eu… eu consigo ver que isso pode acontecer.”
O que disseram a Ucrânia e a Europa?
Após o encontro, na manhã desta segunda-feira (16), Trump participou de conversas por telefone com o ucraniano Volodymyr Zelensky e representantes da Europa.
Após a ligação, um grupo de líderes europeus publicou uma declaração conjunta dizendo que “o próximo passo agora deve ser novas conversas, incluindo o presidente Zelensky”.
Segundo o comunicado, assinado por França, Itália, Alemanha, Reino Unido, Finlândia, Polônia e representantes da União Europeia, a Europa estaria pronta “para trabalhar com o Presidente Trump e o Presidente Zelensky rumo a uma cúpula trilateral com apoio europeu”.
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“Estamos prontos para manter a pressão sobre a Rússia”, afirma o comunicado, acrescentando que “a Ucrânia pode contar com nossa solidariedade inabalável enquanto trabalhamos por uma paz que salvaguarde os interesses vitais de segurança da Ucrânia e da Europa”.
Já Volodymyr Zelensky afirmou ter dito a Trump que as sanções contra a Rússia deveriam ser reforçadas “se não houver uma reunião trilateral ou se a Rússia tentar evitar um fim honesto para a guerra”.
“As sanções são uma ferramenta eficaz”, disse o presidente ucraniano em um comunicado, reiterando também que “todas as questões importantes para a Ucrânia devem ser discutidas com a participação da Ucrânia, e nenhuma questão, particularmente as territoriais, pode ser decidida sem a Ucrânia”.
Após as conversas com Trump e líderes europeus, Zelensky também pediu o fim da matança, um cessar-fogo em terra e no ar, a libertação de prisioneiros de guerra ucranianos e a manutenção da pressão sobre a Rússia enquanto os combates continuam.
“A segurança deve ser garantida de forma confiável e a longo prazo, com o envolvimento da Europa e dos EUA”, disse.
O presidente ucraniano também confirmou que irá se reunir com Donald Trump em Washington na segunda-feira (18/8).
Para James Waterhouse, correspondente da BBC News na Ucrânia, o resultado da cúpula no Alasca, sem um anúncio de um cessar-fogo, foi um golpe para a Europa e para Kiev, que haviam pressionado Donald Trump intensamente antes da reunião para que chegasse a esse objetivo.
“A busca por um acordo de paz duradouro levará tempo, e parece que os combates continuarão até que esse momento chegue. Isso convém à Rússia e não à Ucrânia”, avalia Waterhouse.
Neste sábado, as forças militares russas continuaram a avançar na Ucrânia. Segundo o Ministério da Defesa de Vladimir Putin, suas tropas tomaram duas aldeias no leste da Ucrânia: Kolodyazi, na região de Donetsk, e Vorone, na região de Dnipropetrovsk.
Desde o início da invasão em larga escala, há três anos, as forças russas expandiram lentamente o território que controlam. Nos últimos meses, elas vêm conquistando avanços incrementais no leste da Ucrânia.
As forças russas estão avançando a uma média de 15 a 16 km² por dia em território ucraniano, segundo o Instituto para o Estudo da Guerra (ISW).
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